O futebol
nasce todos os dias. Basta uma bola rolar. Pode até nem existir, ser
imaginária. Parecer uma bola ou não ter nada a ver com ela. Tanto faz. Pode ser
em um gramado, na terra batida, no asfalto, na sala de casa, nos sonhos. Idem.
O futebol respira, sim, todos os dias. Na tabela imperfeita, no drible de
sorte, no chute desviado, no gol contra. Na genialidade, então, transpira e
inspira. É assim desde a segunda-feira, dia 26 de outubro de 1863. Há exatos
150 anos.
O futebol definha, porém. Todos
os dias, até. Ou, pelo menos, naqueles dias em que sua essência é colocada de
lado. Quando deixa de ser um esporte entre iguais, entende? Na banana atirada
contra um negro. Na intolerância machista. No confronto de torcidas adversárias.
No tiro que quase matou Lucas Lyra, lembra? Nos desmandos dos cartolas. No
atleta vendido. No juiz corrupto. Da assinatura de sua certidão de nascimento,
na Freemason’s Tavern, em Great Queen Street, Londres, não se esperava também
este futuro. Mesmo assim, este foi o seu destino. Passados exatos 150 anos.
A taverna que viu a luz ser dada
ao Football Association (FA) deixou de existir, em 1909. Acabou demolida. A
aprovação do conjunto de 13 regras (que, mais tarde, passaram a ser 17) ficou
de legado para o regimento do esporte, como é conhecido até hoje. Regras essas
que o separaram de vez do rúgbi. As raízes do futebol, no entanto, podem datar
de mais de três mil anos. Assim, pelo menos, afirmam alguns historiadores. Para
isso, são considerados precursores tanto o tsu-chu dos chineses como o kemari
dos japoneses, além do epyskiros dos gregos e o harpastum dos romanos.
Antes da FA - não é certo
traduzir como “futebol associação” ou “futebol associado”. O mais correto
seria: “Futebol da associação” -, o futebol era praticado em Cambridge, Oxford,
Sheffield, colégios e universidades, clubes e agremiações. Não havia
uniformidade. Com cada um desses lugares apostavam em uma melhor forma de jogar
o esporte. Para que partidas e até campeonatos pudessem ser disputadas, o
presidente de um clube de Barnes, Londres, Ebenezer Morley, decidiu convocar 13
representantes de outros grupos para a fundação, na taverna de Freemason’s, da
Football Association. A partir deste “pontapé organizacional” o esporte pôde, enfim,
sair fortificado do Império Britânico e, logo em seguida, ganhar outros países.
Nos braços do paulistano Charles
Miller, em 1894, as primeiras bolas desembarcaram em terras brasileiras. Com as
regras já pré-definidas, coube ao solo tupiniquim apenas se mostrar fértil para
aquela ainda infanta criação. Os frutos se espalharam do Oiapoque ao Chuí.
Norte, sul, leste e oeste passaram a aprender que o futebol não poderia ser
encarado apenas um esporte. Aqui virou questão de alma. E isso se explica por
aquele gosto salgado da lágrima, quando cai no sorriso, após o berro do gol,
convertido aos 48 minutos do segundo tempo. No abraço em um desconhecido. Nos
cinco títulos mundiais. E na vocação para fazer a bola rolar como ninguém mais
faz. Difícil até de se explicar. Quem sabe com mais 150 anos de história? Quem
sabe..
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